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sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Retrato "de" meu pai ou retrato "do" meu pai?

 É facultativo o uso do artigo antes de possessivos. Escrevemos:

de minha infância... as minhas vitórias.

Se o possessivo se refere a nomes de parentes, comumente não se usa artigo. 

"Gostou muito do retrato de meu pai." (M. de Assis: Dom Casmurro, p. 235.) 

Só em Dom Casmurro há 115 textos que roubam essa lição. Na linguagem doméstica e nos casos de ênfase, podemos empregar o artigo com possessivos referentes a nomes de parentes. 

"Mulher, eis aí o teu filho! Filho, eis aí a tua mãe!" (Dom Casmurro, p. 309). "Quando eu via o meu filho chupando o leite da mãe..." (Ib., p. 334).

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A fim de ou Afim de ou A-fim-de?

A fim de grafa-se deste jeito, separadamente, desde 1943. Veja-se o Pequeno Vocabulário. E não se põe hífen ali, porque nenhuma locução tem seus elementos ligados por hífen: Casa da América, Campo Belo (lo. substantivas), vós outros (loc. pron.), através de, apesar de (loc. prepositivas), contanto que, ainda que, posto que, a fim de que (loc. adverbiais). Diz o Formulário Ortográfico; "Quando, porém, as locuções se tornam unidades fonéticas, devem ser escritas numa só palavra: acerca, afinal, apesar, debaixo, defronte, depressa, devagar, resvés, etc."

Que é preciso fazer ou O que preciso fazer?

Rui condenava o emprego do antecedente o junto do que interrogativo. Firmino Costa, no Léxico Gramatical, depois de tratar desse ponto de linguagem: "Que interrogativo, e não o que, é a construção regular de genuína, é a forma que tem por si a tradição clássica." Entretanto, esse o muitas vezes pode ser usado antes do interrogativo que: é um elemento reforçativo. Said Ali, em Dificuldades da Língua Portuguesa, liquidou essa questão gramatical, aliás muito controvertida . 

"Mas então o que seria crítica?" (M. de Assis: Crítica Literária, p. 186.) 

"Que é preciso fazer para vir a tê-la?" (Id. Histórias Românticas, p. 291.)

"E os outros? O que é que dizia?" (A. Herculano: O Monge de Cister, I. p. 299.)

segunda-feira, 27 de julho de 2020

Traz ou trás?

Não se confunda traz, de trazer, com trás.
Traz, de trazer, tem z, porque trazer vem de tracere, e c latino, antes de e, ou i converte-se em z.
Trás origina-se de trans, e o grupo nss. Outras provas: mensa - mesa; mense - mês.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Fiz ou Eu fiz?

Não se estampe à toa o pronome-sujeito eu. O abuso dele é cópia do inglês, do francês. Os ingleses não o dispensam porque as formas verbais não denunciam o sujeito com clareza. Um exemplo apenas: I like, you like, he like, we like, they like. Com exceção da terceira pessoa do singular, as demais pessoas são semelhantes, não há uma desinência que as distingua. Daí a necessidade que tem a língua inglesa de escrever ou pronunciar o pronome-sujeito, visto que a desinência do verbo o traz latente.
Fiz não tem outro sujeito senão eu. Fizeste tem por agente tu. Fizestes é o predicado de vós. Por conseguinte, eu fiz é dizer pleonástico, que só podemos usar em situações especiais. (V. Juan Moneva y Puyol: Gramática Castellana, p. 306).
Podemos estampar o sujeito:

1. Quando há ênfase;

"Eu sou a luz do mundo". No latim o pronome ego raramente aparece. Quando se usa ele, o sentido é enfático: "Ego sum lux mundi".

2. Quando há oposição de sentido: Eu trabalho; tu vives folgado. 
"Eu passo; tu ficas" (M. de Assis: Quincas Borba, p. 197).

3. Quando a primeira pessoa pode confundir-se com a terceira: Eu tinha onze anos. Tinha pode ter por sujeito: ele, ela, você, V. Sa., etc. 

4. Nas orações intercaladas: "Não podia, creio eu, recomendar melhor o seu nome à gratidão dos amigos de nosso idioma. "És tu, ó Francisco Bragadas?" (Camilo; Novelas III 10.)

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Cujo o livro ou cujo livro?

Em cujo seio, e não em cujo o seio... Esse o é descabido. O relativo cujo traduz a ideia de posse do genitivo latino cuius. Sendo assim, só se deve empregar com essa ideia de posse. 
O povo em regra não sabe usar o relativo cujo corretamente, mas ideia de posse que ele encerra, esse mesmo povo expõe em torneios sintáticos defeituosos. Um período como este: Vi o rapaz em cuja casa estivemos, sairia da boca do povo assim: Vi o rapaz que estivemos na casa dele
O relativo cujo vem sempre acompanhado de antecedente ou de consequente; concorda sempre em gênero e número com o consequente. Faltando tais elementos, a frase é defeituosa.
O rapaz cujo vi estava raivoso - trecho incorreto. Quem não percebe que o cujo está ocupando o lugar do relativo que?
Raramente se usa hoje o relativo cujo em textos assim: 

  • "Falei então da confusão da minha alma, e devia dizer em que é que ela consistia, e cuja era a causa." (M. de Assis: A semana, III, 441.). 
  • "Assim atarão os judeus em Jerusalém ao varão cuja é esta cinta..." (A.P. de Figueiredo: BÍBLIA SAGRADA, Atos, 21:11.) 
  • "E cujo é esse nome?" (Herculano: O Bobo, 183.). 
O relativo em apreço pode vir regido de preposição: 
  • "Perfeitamente ensaiados, graças aos esforços do Sr. Jerônimo Martinez, de cuja proficiência musical é inútil dar notícias aos leitores..." (M. de Assis: Crônicas, II, 17.). 
  • "A Folha do Pará em obrigação de verificar a notícia e informar os seus leitores, em cujo número estou." (Id. ib., III, 35.)

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Demais, ademais, ou ao demais

Podemos dizer, indiferentemente: demais, ademais, ao demais. Significam: além disso. 
Provas: 
  • "Demais, a emoção da madrasta era significativa." (M. de Assis: Iaiá Garcia, pp. 162-163).
  • "Ademais, que desejam eles com esses reparos?" (Otelo de Souza Reis: Análise Léxica, p. 21) .
  • "Ao demais, a injúria produzida a reação de amor..." (M. de Assis: Iaiá Garcia, p. 220). 

Me faça um favor ou faça-me um favor?

Em linguagem literária não se deve começar um período com variação pronominal átona. Tolerá-se a dissínclise (má colocação) na linguagem doméstica e na poesia. Sabemos que escritores modernistas gostam de estampar o pronome no rosto da proposição; mas eles não podem servir de padrão de vernaculidade. Respondendo a um consulente que o interroga a respeito da posição do pronome oblíquo átono no começo da sentença, assim se expressa José de Sá Nunes: "É solecismo empregar-se o pronome oblíquo átono no começo do período. Não duvido, porém, de que mais tarde, daqui a meio século, talvez, o uso popular do Brasil consiga enobrecer tal colocação pronominal" (aprendei, II, 117.)